Tese - Heitor Silva Biondi

GOVERNAMENTALIDADE DO PARTO: modulações na parturição na perspectiva de profissionais da assistência obstétrica

Autor: Heitor Silva Biondi (Currículo Lattes)

Resumo

As maneiras como assistência ao parto são desenvolvidas advém da construção histórica dos saberes e verdades, que constituem em uma intelecção das práticas envoltas na parturição, configurando-se em racionalidades. Por estarem difundidas e introjetadas no corpo social, as racionalidades passaram a prescrever condutas e regular comportamentos, por meio do acionamento de instituições, procedimentos, táticas, estratégias, análises, reflexões e cálculos que, articuladamente, engendrando uma governamentalidade do parto. Partindo desta compreensão, este estudo de natureza qualitativa, exploratória e descritiva, tem como objetivo de analisar como a governamentalidade engendrada por racionalidades modula a parturição através do governamento dos sujeitos. Possuindo como referencial teórico-analítico as teorizações sobre a governamentalidade, teve como cenário investigativo o Centro Obstétrico de um Hospital Universitário no sul do Brasil. Participaram 24 profissionais de saúde que atuam diretamente na assistência ao parto, sendo 10 enfermeiras(os), e 14 médicas(os). A produção dos dados se deu por meio de entrevista semiestruturada, realizadas durante o mês de julho de 2022, sendo as falas analisadas por meio das ferramentas analíticas da governamentalidade. Os aspectos éticos concernentes às pesquisas foram respeitados durante seu desenvolvimento. O estudo foi apreciado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa, registrado sob o número 5.492.379, e Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE), número 58273022.6.0000.5324. Por meio do processo analítico foram constituídos três artigos. O primeiro artigo revela que muitos dos saberes e verdades relativos à gênese e consolidação da ciência obstétrica permanecem sedimentados nas práticas assistenciais, demonstrando-se como racionalidade, que é antagonizada por outras racionalidades, em um contraste discursivo da ciência contemporânea, frente a outros conhecimentos e ações que sustentam práticas considerados parcial ou totalmente obsoletos. Este constructo está associado a formação profissional e a composição de um ambiente de trabalho que fomenta, de modo insidioso, uma compreensão patologizada das vivencias singulares do parto, elencando a medicalização como uma necessidade. O segundo artigo demonstra que o governamento das condutas das mulheres tem início já no pré-natal, através de estratégias que visam a subjetivação, efetivadas por um crescente pedagógico voltado a assegurar a internalização de certas verdades, e a disciplinamento das mentes e dos corpos, e são somadas a outras estratégias, como a busca ativa de mulheres que não iniciam ou abandonam o pré-natal, a criação de grupos de gestantes e o entrelaçamento das estratégias governamentais de gestão da vida e da sociedade, que permitem a captura e vigilância efetivas, por articular distintos vetores de força sociais e institucionais, através de discursos que versam acerca das dimensões da segurança, da insegurança, e do risco. Este conjunto visa a docilidade diante das práticas de disciplinamento, bem como, o estabelecimento de um governo de si que efetive a autorregulação dentro dos moldes estabelecidos pelos profissionais, incluindo o afastamento de condutas anormais e desviantes. Já o terceiro artigo aborda a centralidade das estratégias maquinadas em meio a sociedade para a obtenção de condutas subjetivadas das parturientes, em que desponta a funcionalidade governamental das relações de poder que ocorrem em distintos contextos e com diferentes indivíduos, com destaque aos familiares e a malha social, viabilizando ações de vigilância e controle dos comportamentos femininos, por meio de práticas pedagógicas, que tem seu conteúdo manifestado posteriormente nos direcionamentos do governo de si. Além disso, destacou-se a positividade do noopoder, a valorização das práticas de medicalização do corpo em contraste com as ações humanizadas, e o respeito a autonomia da mulher, sendo esta resultante da subjetivação anterior a verdades e discursos que ganham espaço em sua fala durante o parto, e a fazem adentrar as engrenagens da condução das condutas dos profissionais. Não somente, foram elencadas novas práticas que incidem na condução das condutas, como os planos de parto; a ampliação progressiva da atuação do enfermeiro obstetra e das doulas; a maior exposição dos eventos singulares da parturição em diferentes mídias e a do aprimoramento tecnológico voltado à gestação e ao parto. Concluiu-se que a assistência ao parto está concatenada a duas racionalidades distintas que modulam a assistência, tendo a atuação profissional papel central nos processos na viabilização de estratégias de governamento. A circulação de discursos acerca do parto em meio da malha social, torna a população instrumento da governamentalidade do parto. Sugere-se o desenvolvimento de novos estudos que possam contribuir para o estabelecimento de estratégias propagar e fomentar em meio a sociedade, práticas discursivas e performáticas alinhadas com as políticas públicas e com a medicina baseada em evidências, sedimentando a racionalidade humanizadora do parto no fazer e na formação dos profissionais de saúde, em detrimento da racionalidade intervencionista.

TESE COMPLETA- GOVERNAMENTALIDADE DO PARTO: modulações na parturição na perspectiva de profissionai

Palavras-chave: EnfermagemComportamentos relacionados com a saúdePartoGovernoPolítica de saúde